A Dança dos prazos
Entrega de apartamento adquirido na planto: a dança dos prazos
“Meu ipê florido, junto a minha cela, hoje tem altura de minha janela”
José Fortuna e Paraíso
“O inadimplemento da obrigação, positiva e líquida, no seu termo, constitui de pleno direito em mora o devedor” é o que determina o Código Civil brasileiro, positivando o princípio do dies interpellat pro homine – o tempo interpela pelo homem – que quer dizer que não é necessário avisar a outra parte quando já se estabeleceu determinado prazo para o cumprimento da obrigação.
Imagine que você adquiriu um ipê que ainda não floresceu e a empresa que te vendeu esse ipê lhe garantiu que ele floresceria num determinado prazo, mas, se a chuva não ajudasse, o prazo seria estendido em 180 dias, para que essa florescência ocorresse.
Como o ramo das bignoniaceaes é supervalorizado, você precisou fazer um financiamento para adquirir o tão sonhado ipê, florido, é claro, para usufruir da sombra que ele certamente proporcionará.
O tempo passou e no dia combinado o ipê, talvez amarelo, não floresceu, mas o financiamento já está sendo cobrado.
Aí vem a parte da dança dos prazos.
O prazo que o vendedor de ipês garantiu que ele floresceria é alterado pelo contrato de financiamento que foi feito para adquirir o ipê?
Quem vendeu o ipê e atrasou seu florescer, vai dizer que sim, só que não é assim.
Para além dos ipês, o prazo para a entrega de apartamentos adquiridos na planta é aquele constante no contrato entre o comprador e a construtora, ainda que o comprador tenha realizado outro contrato de financiamento para a aquisição do imóvel.
Não há novação do prazo, neste caso, como advoga o plantador de ipês.
E a matéria é pacificada, inclusive, em sede de IRDR – Incidente de Resolução de Demanda Repetitiva – pelo STJ, Tema 996, que firmou a tese: Na aquisição de unidades autônomas em construção, o contrato deverá estabelecer, de forma clara, expressa e inteligível, o prazo certo para a entrega do imóvel, o qual não poderá estar vinculado à concessão do financiamento, ou a nenhum outro negócio jurídico, exceto o acréscimo do prazo de tolerância.
Ainda, a tese estabeleceu a presunção do prejuízo pelo atraso na entrega, nos seguintes termos: No caso de descumprimento do prazo para a entrega do imóvel, incluído o período de tolerância, o prejuízo do comprador é presumido, consistente na injusta privação do uso do bem, a ensejar o pagamento de indenização, na forma de aluguel mensal, com base no valor locatício de imóvel assemelhado, com termo final na data da disponibilização da posse direta ao adquirente da unidade autônoma.
Logo, não há sequer divergência, ao menos jurídica, de que o prazo a ser cumprido é o do contrato entre o comprador e o vendedor de ipês, ou melhor, a construtora.
Há quem diga que nesta comarca florescerá outro ipê, talvez branco, e há indícios de que a florescência levará mais tempo do que o previsto.
(Advogado especialista em Direito Imobiliário e vice-presidente da Comissão de Direito Imobiliário da 4ª Subseção de Rio Claro/SP)

Leandro César Crispim